terça-feira, agosto 29, 2006

Centro de Desenvolvimento Comunitário do Bairro dos Lóios

Há 25 anos, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa dava o primeiro passo para criar o primeiro centro comunitário na cidade. Desde então, pequenos grandes passos têm sido dados no sentido de proporcionar à população do Bairro do Lóios, em Marvila, ferramentas para traçar o seu próprio destino. O seu papel no desenvolvimento do bairro, que há 25 anos era composto apenas por habitação social, foi crucial e hoje é reconhecido por todos.

Cidadania activa

O Centro de Desenvolvimento Comunitário do Bairro dos Lóios é a segunda casa de centenas de jovens e idosos. A primeira equipa de trabalho e os primeiros utentes ainda hoje recordam a loja 31, onde tudo começou, onde se sentavam em tijolos, porque estava tudo por fazer. Foi preciso dedicação, força de vontade e olhar à volta para ver que aquela população precisava de uma mão amiga.

Não havia equipamentos sociais, jardins, autocarros, caixotes do lixo, passadeiras ou iluminação. O bairro era composto por núcleos de pessoas que estavam isoladas, ao Deus dará. Paula Morais, directora do Centro de Desenvolvimento Comunitário, confessa que a Santa Casa “acabou por dar algumas respostas atípicas ajudando no desenvolvimento do bairro, não sendo, no entanto, essa a nossa intenção.

O nosso objectivo era levar a comunidade local a encontrar respostas às suas necessidades. Mas inicialmente tivemos de ser nós a dar o primeiro passo”. Foram então criadas condições para as crianças ocuparem os tempos livres, ou seja, “criámos ATL, centros de convívio para idosos e animação sócio-cultural para as famílias. Foram criadas equipas de apoio e os Lóios começaram a ganhar forma de bairro”.

A Santa Casa iniciou, há dez anos, um processo inverso cujo objectivo era libertar o Centro Comunitário de determinadas responsabilidades, passando-as para a população. O objectivo inicial, de incentivar o desenvolvimento da cidadania, onde a população fosse um parceiro activo está hoje cem por cento cumprido. A população do Bairro dos Lóios está perfeitamente integrada e sente que tem com quem contar...

Educação para a cidadania

Há três anos que a nova casa do Centro de Desenvolvimento Comunitário do Bairro dos Lóios é comum a centenas de pessoas. Ali vivem em comunidade e fazem parte integrante da vida daquele centro. São a alma de um espaço que consideram como seu. As paredes são o testemunho disso mesmo. Ali estão expostos rostos de felicidade, vivências de pessoas que sentem que têm sempre uma mão amiga em qualquer fase da vida. Centenas de fotografias contam a história do dia-a-dia daquela casa. Mas, mais do que fotografias, os rostos, as gargalhadas que se ouvem nos corredores do Centro não deixam dúvidas.

Numa pequena sala, um grupo de utentes joga às cartas. “São os viciados no jogo”, diz Paula Morais, em tom de brincadeira. Respondem: “Somos viciados é no centro”, confessa Maria Adília Lopes, 71 anos, sem tirar os olhos do jogo. “Há 25 anos que venho para cá, estas pessoas são a minha família, acarinham-me”. Tem sete filhos, 15 netos e cinco bisnetos, mas “cada um tem a sua vida e sabem que aqui eu estou bem, por isso estão descansados”.

Noutra sala, um grupo de senhoras está a trabalhar num tapete. É o grupo de artesanato. Dedicam-se de corpo e alma aos trabalhos manuais que expõem e com os quais ganham dinheiro. Aqui não há tempo a perder, todos os minutos são preciosos para acabar o trabalho a que se propuseram. Numa pequena cozinha, jovens confeccionam um bolo. Esta é a tarefa diária a que se dedicam com gosto. O objectivo é fornecer o bar que lhes paga o trabalho e com esse dinheiro o grupo de jovens organiza eventos.

Paula Morais explica que tudo tem uma razão de ser. A filosofia do trabalho comunitário incide na participação. As muitas actividades do Centro abrangem jovens desde que frequentem o 5.º ano até aos 25 anos e idosos que frequentam o centro de convívio, actualmente cerca de 200 pessoas. Cada grupo é responsável pelas suas actividades e todos têm opinião e capacidade de decisão, por isso foi implementado um método de funcionamento. “Temos três grupos de gestão, o dos jovens, o do centro de convívio e o do bar, que é intergeracional. Cada grupo tem uma conta própria que gere com a ajuda do Centro. Este dinheiro serve para organizarem festas, convívios, sardinhadas e passeios. O objectivo é incentivá-los a terem uma vida activa e a decidirem aquilo que ainda querem fazer”.

Nas reuniões semanais é feita a gestão do dinheiro e a responsabilidade é sempre dos utentes. O objectivo é pôr a comunidade a intervir e esta agradece. Desta forma a solidão não é a companhia dos mais idosos, nem dos jovens que partilham amizades, conhecimento e as actividades desportivas e lúdicas de que mais gostam!

In "Expresso do Oriente", Agosto de 2006